segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Venenosa

Hi, there!!
Como prometido, vcs agora irão conhecer a história de Laura, a menina morta que não encontrou nadica de nada de luz, muito pelo contrário. Ela ainda tem muuuito o que resolver aqui nesse planetinha azul, cheio de coisas tão estranhas quanto rolhas, funk carioca, ursos polares e adolescentes no ensino médio. Espero que aproveitem!! =)

*Ah, como brinde, aí vão o prólogo e a primeira parte da história, de uma vez só. ^^

Prólogo

De repente, eu não acordei.

Era uma quarta-feira, 7:15 da manhã. Eu deveria estar na escola, ou, na pior das hipóteses, atrasada para ir à aula. Mas, ao invés disso, lá estava eu, deitada em minha cama, sem me mover. Aliás, não foi por falta de tentativas. Eu lutava com todas as minhas forças para me levantar, me arrumar e seguir até a escola, mas todo o esforço era inútil: eu permanecia imóvel.

Se aquele fosse um dia normal, eu teria acordado às 6:03 (sim, eu adorava programar o despertador para apitar nos horários mais estranhos possíveis), ido até o banheiro para arrumar meu cabelo e me trocar, tomado leite com Toddy, conferido se estava levando tudo que era necessário no dia, me despedido da minha mãe e ido embora. Chegaria na escola, me sentaria no meu lugar e esperaria. Esperaria a aula começar. Esperaria a aula acabar. Esperaria a hora do almoço. Esperaria a hora de ir pra casa. Esperaria. Acontece que passei toda a minha vida esperando, e nada de extraordinário aconteceu.

Eu sentia meu corpo pesado como chumbo, não conseguia mover um músculo sequer. Depois, fui me sentindo leve, muito leve, até que já não me sentia. Eu podia observar meu próprio corpo do alto, como se não fosse meu corpo.

Passei por situações horríveis na vida (não tantas, mas algumas muito ruins) e lhes digo: NADA foi pior do que ver aquilo. Minha mãe chegou no quarto para ver o que estava acontecendo, por que eu ainda não havia me levantado, e eis que ela realmente viu.

Eu estava morta.

Não pretendo entrar em detalhes do acontecido, já que nem eu mesma sei explicar o que houve. Apenas devo dizer que os dias que sucederam minha morte foram os mais incríveis. O mais inimaginável, improvável, aconteceu: nunca, em vida, estive tão contente e satisfeita.

 

 

Christie

Aparentemente, ninguém imaginava que aquilo fosse acontecer. Alguns receberam a notícia com um misto de surpresa e tristeza. Outros nem sequer se abalaram, mas fingiam que havia sido uma grande perda.

Mandaram rezar uma missa pela minha alma. A escola inteira compareceu, até mesmo pessoas que eu nunca havia visto. Durante a cerimônia, a maioria estava se sentindo mal. Talvez por acharem que deviam ter me dado mais atenção enquanto eu estava viva, não sei. Outros choravam ao ouvirem as palavras do padre.

Mas, de todos os presentes, a pessoa que mais me chamou a atenção foi Christie. Ela se sentou em um dos primeiros bancos, próxima à minha família. Chorava copiosamente. Aliás, durante o tempo em que convivi com ela, se dizia sensível, até chorona demais. Mas a verdade é que nunca havia a visto chorar (até aquele momento). Seu rosto estava diferente. Estava com enormes olheiras negras sob os olhos, sem nenhuma maquiagem, pálida. Usava um vestido azul-marinho, completamente diferente das roupas que costumava usar. Talvez ele estivesse enfiado no guarda-roupa há muito tempo, ou talvez ela o tivesse pedido emprestado a alguém. Seus cabelos estavam presos em um rabo de cavalo simples, até feio. Nem sequer parecia a linda bonequinha que eu havia conhecido.

Quando entrei para a escola onde estava fazendo o ensino médio, ainda não a conhecia. Pra falar a verdade, não conhecia ninguém. Mas ela já era cheia de amigos, na nossa e em outras turmas. Segundo uma vez me disse, ela estava decidida a ser popular no colégio desde o dia em que nele ingressou.

Quando estávamos mais familiarizadas com as colegas, – era uma sala somente de meninas – percebi que não ia com a cara dela. Falava alto, ria alto, andava como se não se importasse com mais ninguém. Matava aula para conversar com os amigos nas escadas e nos corredores. Aquilo me irritava.

Era linda. Já ouvi inúmeras estórias de colegas nossos que tentaram alguma coisa com ela. Com um deles, Enis , ficou um bom tempo. Fiquei sabendo que terminaram e voltaram várias vezes antes do fim definitivo. Sempre havia alguém apaixonado por ela. Se mostrava sempre meiga, simpática, sorridente e alegre. Isto é, apenas com os amigos.

Certa vez fizemos um trabalho em grupo. Mal nos falamos. Eu deveria passar o texto a limpo e enviá-lo por e-mail para o professor, mas eu não havia anotado o endereço. Ela anotara, e eu fiquei de ligar para ela para saber qual era. Liguei, porém não me atendeu. Agira friamente. Tal impressão ficou em minha mente por muito tempo.

Com o passar do tempo, fui me aproximando mais dela. Era realmente muito carismática, uma ótima companhia. Nos tornamos melhores amigas. Eu lhe contava todos os meus segredos (bem, não todos, pois a gente nunca conta todos os nossos segredos para ninguém) e ela também me contava coisas sobre sua vida. Junto com a Sally, nos tornamos inseparáveis. Sem perceber, fui me transformando em uma delas. Ouvia as mesmas músicas, me vestia da mesma maneira, assistia aos mesmos programas. Éramos como irmãs. Além de juntarmos nossas carteiras durante as aulas, almoçávamos juntas todos os dias e à noite entrávamos na internet para conversar. Nunca nos faltou assunto. Dormi na casa da Christie uma vez e mais uma na casa da Sally. Às vezes, combinávamos de sair nos fins de semana e nunca ficávamos mais de um dia sem nos falar. Irritávamos professores e colegas com nossas intermináveis conversas. Toda a sala nos desprezava. Algumas nos achavam fúteis, outras nos achavam chatas. Outras simplesmente tinham inveja de tanta amizade.

Juntas, superávamos todas as dificuldades que surgiam. Éramos uma equipe, um time. Não éramos ninguém se não fôssemos todas.

Dias antes da minha morte, eu cheguei na escola e elas já estavam sentadas em seus lugares, conversando. Tentei puxar um assunto qualquer (ultimamente estava faltando assunto), mas não obtive grandes reações. De repente, elas pareciam me ignorar. Não me chamavam mais para sair da sala com elas, falavam baixo perto de mim para que eu não ouvisse, estavam frias e distantes. E o pior: eu nem sabia o que havia feito, se é que havia feito algo de errado. Sofri muito, sem ter com quem desabafar, já que elas eram minhas únicas amigas.

No final das contas, morrer tinha suas vantagens. Uma delas era que eu podia, agora, saber o que é que as pessoas estavam pensando. No final da missa em minha homenagem, pude entender o motivo pelo qual Christie chorava. Ela estava sentindo algo que nunca antes havia sentido: estava arrependida.

xoxo

Mari

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